domingo, 7 de agosto de 2011

O Curso de Inglês

Apesar de sempre termos uma relação difícil com o passado, não importando se ele foi bom, ruim, ou se teve ambos os momentos, ninguém pode negar que, algumas vezes, é muito bom sentir saudade. E principalmente quando ocorrem certas lembranças de coisas que estavam completamente apagadas de sua memória. Ou tão bem guardadas que você as julgava sem qualquer importância. Ou pior: que você se dá conta que lembrava delas todos os dias, religiosamente, mas com outra roupagem, não dando à lembrança o devido valor.

Uma lembrança que tenho muito viva em minha memória é a dos meus anos no curso de inglês. Eu era bem jovem e sequer pensava em problemas de relacionamento com amigos, neuroses sobre o futuro ou auto-afirmação. Pelo menos quando estava dentro daquela sala, todas as terças e quintas, das 15h30 às 16h45, durante mais ou menos 6 anos. Era um universo paralelo tão bom, tão sadio, tão engraçado, tão lúdico, que eu me sentia, regularmente, capaz de qualquer coisa dentro daqueles muros.

Parecia que eu usava uma roupagem nova sempre que a hora do curso se aproximava. Eu deixava as dúvidas e inseguranças dentro do armário, junto com minha roupa de ficar em casa, e ia para a aula com outra roupa: a da confiança, da distribuição de alegria e bons relacionamentos. Tudo era mais leve, tudo era mais saudável. Era tudo melhor. Desde o professor, fã de cavaleiros do zodíaco e um dos maiores exemplos de educadores que tive, o grande professor Ota, até os especiais de final de nível, quando fazíamos covers vergonhosamente ruins, mas que eram motivos de risadagens.

Como não lembrar também das paqueras de filmes de sessão da tarde que eu e meus amigos cultivávamos. Foi no curso de inglês que tomei meu primeiro fora. E lembrando de hoje, é engraçado ver como era tudo tão levado a sério, tão adulto. Me pergunto se hoje todos nós não continuamos cometendo esse mesmíssimo erro... Lembro como foi bom construir amizades com amigos apreciadores de Metal. Alguns intolerantes, engraçados. Outros abertos à opiniões, e igualmente engraçados. Também me recordo como era sair da aula, tomar aquele velho copo d'água e deixar as meninas na rua da casa delas. Isso uma atitude adulta e de um gentlemen, para um menino de 13, 14 anos.

Lembro como me senti quando soube que Ota era apaixonado pelo Red Hot Chili Peppers, e sabia tocar tudo em sua guitarra, quando ensaiava com sua banda "O Olho que Tudo vê". E de como em todo exerício que tínhamos que trabalhar a audição, lá estava Anthony Kiedis na fita cassete do som. Me dando conta agora, Ota deve ter sido o principal responsável pela minha idolatria pelo RHCP. e pensando mais profundamente ainda, ele deve ter sido o primeiro exemplo real de professor "ideal" que tive na vida, e que, a partir dali, já tenha feito eu me encaminhar pro universo da educação. Bem, ninguém é perfeito.

O encerramento do curso foi da melhor maneira possível: num hotel, em Recife, com todos nós recebendo nossos certificados, e batendo um papo com o Angra no hall do hotel. Angra que, na época, para nós, era o auge do Metal. Lembro de como estávamos curiosos para nos encontrarmos sem as roupas normais das aulas: bermudas, bonés, saias curtas, camisas velhas etc. Lembro de como foi uma despedida sem a menor ideia e peso de que não nos veríamos mais. Disso eu me arrependo. De ter dado pouco valor. Ou talvez eu esteja errando hoje, de dar valor demais aquilo. Vai saber.

Atualmente mantenho um contato tímido com duas pessoas daquela época. Daquela sala. Mas passo quase que diariamente em frente ao curso. E todos os dias sinto uma vontade incomensurável de adentrar aquele prédio de novo e sentir aquelas paredes: se o quadro de avisos está no mesmo lugar, se já trocaram de novo o local da secretaria, se ainda existe aquele pequeno jardim em frente a cantina. Se os professores são os mesmos. Farei isso. Resguardar aquela felicidade inocente e fantástica do fundo do baú. Ou do fundo da mente. Exercitemos nossas lembranças. Não nos esqueçamos delas.

Essa nostalgia eu faço questão de ter quase que diariamente.

Um comentário:

  1. Excelente, cara. Gostei muito do que li. Me fez relembrar de mil coisas aqui. Abraço.

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